Política

O estranho ruído que escuto quando alguém fala em “Intervenção Militar”

Uma das memórias que tenho de minha infância era o temor que tinha de um barulho em especial. Logo que nos mudamos – meus pais, meus irmãos e eu – para o Conjunto Nova Natal – um dos bairros de periferia de Natal em meados da primeira década dos anos 80 projetados para afastar as populações mais carentes – as ruas deste mais pareciam desertos. Mas, por mais estranho que possa parecer, nos primeiros anos em que conjuntos como o Nova Natal surgiram, a população de crianças e jovens levava uma interessante vida àqueles bairros.

Mas todos compartilhávamos de um medo em comum e do desafio de enfrentá-lo: as famosas rondas policiais e suas Toyotas eram atemorizantes para todos. Em 1984, com quase dez anos de idade, eu, como outros, tremia de medo sempre que ouvia logo às 9h da noite não a sirene, mas aquele barulho de algo se desmanchando enquanto vinha em nossa direção. Me assustava justamente porque, diziam alguns, quem era pego por aquelas viaturas dificilmente voltava.

O golpe militar estava felizmente morrendo. As viúvas da ditadura já se preparavam para o inevitável, mas, ainda assim, estávamos distantes de uma democracia, uma vez que ainda vivíamos sob o jugo dos militares.

Era estranho ter que conviver ao mesmo tempo com aquele temor e com um certo ar de esperança dos comícios pelas Diretas Já, algo que raramente nossas tevês mostravam. A verdade é que, com o tempo e com a adolescência, percebemos que aquele barulho que nos assustava a todos era o medo dos tolos: um medo que só carrega aqueles que não sabem o significado da palavra liberdade, da troca de experiências, da confiança entre iguais, entre os que, esquecidos pelo Estado e por uma hipócrita sociedade, tinham que se virar com o que estava disponível ali…

Quando alguém ousa perguntar porque tenho ódio contra qualquer um que clame pela volta dos militares ao poder, me vem sempre à memória aquele barulho de algo desconjuntado, medonho, arrastando-se pelas ruas dos bairros de periferia procurando jovens para sumir com eles, levá-los para o inominável… Me vem a memória a lembrança que lá naquele instante e hoje em bairros de periferia por este país continuamos a sentir o peso de um país e dos seus mais abastados que esquecem facilmente o tipo de monstro que um regime de exceção cria.

Quando alguém ousa pedir a volta da ditadura no lugar de nossa duramente conquistada democracia gosto de imaginar este tipo de imbecil vivendo e vendo seus filhos crescendo em um bairro de periferia deste país onde o medo dos Agentes do Estado e do que eles são capazes de fazer com estes mesmos filhos representam ainda uma triste realidade.

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Comunicação, Política

Esse tal “jornalismo” auto-referente dos nossos jornalões é tudo, menos Jornalismo…

Os descaminhos do Jornalismo enviesado e auto-referente praticado no Brasil foi bem representado neste fim de semana em duas matérias das Folha de São Paulo: em uma primeira matéria, o próprio jornal diz ter “apurado” que o ex-presidente FHC teria se reunido com integrantes do PT para buscar uma “aproximação”.

Vejam bem, a própria matéria afirma que o improvável, impossível e impensável estaria em andamento: uma víbora como FHC estaria disposto a esquecer as desavenças, os achaques, os conflitos recentes, as polêmicas, os ditos e difundidos, para abraçar uma “trégua” – com a confirmação do próprio.

O problema deste tipo de “jornalismo” que se auto-referencia praticado por nossos jornalões é que ele está orientado aos interesses dos donos destes grupos empresariais e daqueles que costumam cortejar.

Não por acaso, o próprio FHC apareceu negando o que menos de um dia dissera. Dizer que FHC é mentiroso e cara de pau é chover no molhado; que o sujeito é oportunista nato e sabe aproveitar-se do timing midiático favorável, também.

O que interessa aqui, entretanto, é ponderar o quão orientados estão nossos jornais à criação de verdadeiras peças ficcionais para ludibriar seus leitores.

Estes, claro, que sequer sabem ler as páginas e entrelinhas de uma imprensa carcomida por seu próprio jogo sujo.

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